Os debenturistas da Rodovias do Tietê levaram um susto, nesta segunda-feira (18), ao receberem a informação de que o papel foi remarcado a preço de “zero reais”. Ou seja, a debênture incentivada que, quando foi lançada, em 2013, era “queridinha” dos investidores, a RDVT11, está no momento valendo zero. O caso é um alerta para quem investe em um ativo apenas olhando seu retorno, sem avaliar os riscos inerentes à aplicação financeira.
Com a promessa de pagar IPCA (inflação oficial) mais 8%, isento de Imposto de Renda (IR), ela atraiu a atenção de pequenos investidores, se tornando o papel com mais CPFs investidos do Brasil. Atualmente, 18 mil pessoas físicas têm a debênture da Rodovias do Tietê.
O papel foi vendido em 2013 como uma das primeiras debêntures incentivadas do mercado ligadas à infraestrutura, isentas de IR para pessoas físicas, e fez sucesso entre investidores dos segmentos de private banking e de alta renda dos bancos, segundo Marília Fontes, analista da Nord Research.
A Rodovias do Tietê é responsável por várias estradas no interior de São Paulo, como a Marechal Rondon, a Rodovia Ernesto Paterniani, a Jornalista Francisco Aguirre Proença, a Rodovia Bento Antonio de Morais e a Rodovia do Açúcar.
A partir de 2015, porém, a empresa começou a enfrentar dificuldades por vários motivos.
Segundo Fernando Prado, analista de investimentos da Mirae Asset, a empresa apostou que a inflação e o dólar iam ficar em níveis baixos, e o país cresceria em patamares mais acelerados. O problema é que durante a crise de 2014 a 2017, o IPCA e a moeda americana dispararam e a economia recuou 7%, reduzindo o fluxo de veículos em 14% nos pedágios das concessões do grupo, e, por conta disso, diminuindo suas receitas.
Por outro lado, as despesas aumentaram. Como o plano nas concessões exigia avultados investimentos em asfalto, que é cotado em dólar, a dívida cresceu.
O resultado foi um balanço com uma série de prejuízos, diminuindo cada vez mais o dinheiro disponível para pagar os juros e amortizações dos debenturistas, diz Marília.
Sem conseguir honrar os termos prometidos aos investidores, que obrigavam que a empresa pagasse juros de 76% do IPCA mais 8%, ela parou de remunerar o ativo e vem tentando repactuar os débitos. A empresa quer trocar a remuneração dos papéis de IPCA mais 8%, para IPCA mais 1%, alterar a data de vencimento da debênture de junho de 2028 para dezembro de 2036, e estender a carência de pagamentos até junho de 2021 para os juros e até junho de 2025 para amortizações.
No último dia 8, em assembleia, porém, não foi possível aprovar o plano de reestruturação para pagamento aos debenturistas, já que era preciso a presença de 100% dos investidores no encontro. Com isso, foi aprovada antes uma antecipação do pagamento, para forçar a companhia a entrar em recuperação judicial.
Foi a alternativa encontrada para a possível aprovação dos novos termos de remuneração aos debenturistas, já que via recuperação judicial, a reestruturação pode ser aprovada em assembleia por maioria.
A questão será resolvida agora pela Justiça. Os debenturistas são credores da empresas em recuperação e ainda podem recuperar algum dinheiro da empresa, que é controlada pela AB Concessões, do grupo Bertin e da italiana Atlantia, e pela portuguesa Lineas Internacional, em dificuldades financeiras.
Risco das debêntures incentivadas
Apesar de ser um ativo em renda fixa, as debêntures incentivadas são títulos em que o investidor empresta para uma empresa e está sujeito ao eventual calote da companhia. Outro risco é que elas não estão cobertas pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC).
De acordo com Prado, agora com os juros baixos, e apesar de serem isentos de IR, os investimentos em debêntures devem exigir os mesmos cuidados que se têm quando se compram ações. “A recomendação é procurar um analista da sua corretora para entender os riscos do ativo”, diz o analista da Mirae.