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Selic cai a 5%, poupança fica negativa, e agora, onde investir? Veja a opinião de 4 especialistas

Confira quais aplicações financeiras escolher após nova redução do juro básico para o menor nível da história

Bárbara Leite

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Investidor precisa arriscar mais neste novo cenário, mas é preciso cautela, estudar e não olhar apenas o retorno–Foto: Pixabay

Acabou-se a época em que o investidor podia “viver” dos juros altos, deixando seu dinheiro “dormir” na caderneta da poupança ou em fundos de investimentos conservadores.

A taxa básica de juros da economia, a Selic, teve seu terceiro corte nesta quarta-feira (30), que a fez cair de 5,50% para 5% ao ano, novo mínimo da história, reduzindo o ganho de aplicações em renda fixa, mais conservadores, que são atrelados à taxa ou a um percentual da taxa DI, como caderneta de poupança, fundos DI, CDBs (Certificados de Depósito Bancários), Tesouro Selic (títulos do governo), LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e LCA (Letra de Crédito do Agronegócio.

Com a Selic em 5% ao ano, a nova poupança (depósitos feitos após 4 de maio de 2012) e de boa parte dos fundos de renda fixa DI já está dando retorno negativo. Sim, negativo. O ganho dessas aplicações já perde para a inflação.

No caso da caderneta, o rendimento recuou a 3,50% ao ano, menos que os 3,55% projetados para o IPCA acumulado em 12 meses. Ou seja, a partir de agora, quem depositar R$ 1 mil na caderneta de poupança corre o risco de sacar, depois de 12 meses, um valor equivalente a R$ 998. Os “R$ 2” de diferença deverão ser corroídos pela inflação.

E o Banco Central (BC) já sinalizou que a Selic deve cair a 4,50% em dezembro, que deixará a poupança rendendo 3,15% ao ano, praticamente metade do que ainda paga a antiga poupança (6,17%). Para 2020, o mercado ainda espera, apesar da sinalização de cautela do BC, que o juro básico caia mais, a 4% ao ano.

Se o cenário já era desafiador, ficou ainda mais. E agora, onde investir na era dos juros baixos e ganhos de investimentos conservadores negativos? O Economia Bárbara foi ouvir quatro especialistas para tentar dar “uma luz” para o investidor, sabendo que cada vez mais o brasileiro precisa se educar para responder aos novos desafios.

Fim da ‘jabuticaba financeira’

“O Brasil era uma ‘jabuticaba (fruta que só existe no Brasil) financeira’. Era um dos poucos países do mundo em que as pessoas conseguiam ganhar dinheiro relevante na renda fixa. Agora a gente está se enquadrando na realidade global. A parte mais frustrante de todas para o investidor é que não tem uma opção que mantenha o ganho dele. Agora, vai ter de se sujeitar a riscos maiores para ganhar a mesma coisa ou talvez menos, mas a opção a isso é ganhar menos ainda”, disse o consultor financeiro André Massaro.

Na procura por um retorno melhor do que as aplicações conservadoras, o investidor precisa tomar risco, mas pode se dar mal.

“Temos de ter cuidado nessa busca de obter um retorno melhor. O investidor precisa avaliar o seu perfil. Eu posso buscar opções que não me garantem um retorno e podem ter até uma perda patrimonial”, alertou a educadora financeira Cíntia Senna.

Para o professor de finanças do Ibmec, Giácomo Diniz, o primeiro passo é o investidor “ter clareza do que é migrar para o mundo da incerteza. Ele tem de ter a consciência que a partir deste momento o retorno que ele vai obter não pode ser previsto. Ele tem de encontrar algum tipo de base para poder sustentar a sua segurança”.

De acordo com Glauco Legat, analista-chefe da corretora Necton, “o cenário de queda da taxas de juros, obviamente, traz algumas mudanças nos investimentos e a renda variável começa a ser vista como um ativo bastante atraente”.

Então, a conclusão é que chegou a hora do investidor se arriscar para tentar lucrar mais. Mas o que escolher? Na renda variável, há muitas opções, como a Bolsa (mercado de ações), os fundos de investimento imobiliário (que investem em imóveis ou ativos ligados ao ramo imobiliário e o investidor recebe uma espécie de renda mensal), as ETFs (Exchange Traded Funds, que são fundos de índices comercializados como ações), os fundos de ações (que investem no mínimo 67% dos recursos em ações ou em papéis cotados na Bolsa) e os fundos multimercados (que investem em vários produtos diferentes, tanto de renda fixa quanto de variável).

E a renda fixa está completamente descartada? Não, não está. Veja abaixo o que recomendam os quatro especialistas:

Fundos de investimento imobiliário: os novos ‘queridinhos’

Recomendados pelos quatro especialistas, os fundos de investimento imobiliário, também conhecidos pela sigla FII, despontam como os favoritos nesta nova fase, vistos como uma “iniciação” à renda variável.

“Não necessariamente o investidor deve ir para ações de imediato, os fundos imobiliários são uma porta de entrada para quem sempre foi costumado a viver de renda fixa”, disse Legat.

Para Massaro, “os fundos imobiliários são o que se mais aproxima do que o brasileiro está acostumado: dão um dividendo mensal”.

Basicamente, os FII aplicam dinheiro em variadas possibilidades dentro do ramo imobiliário, e existem dois grandes tipos: os de “tijolo” (são aqueles investem majoritariamente em empreendimentos físicos como na aquisição, construção ou aluguéis de imóveis ditos como comerciais, a exemplos dos shopping centers, faculdades, galpões e armazéns, escritórios) e os de “papel”, que investem em títulos financeiros que estão ligados ao mercado imobiliário.

Para os especialistas, o investidor deve olhar os fundos de “tijolo”. “Geralmente, um fundo de papel acaba sendo um ativo de renda fixa, então não vale a pena trocar a renda fixa por um fundo de renda fixa”, destaca o consultor financeiro.

O investidor tem duas formas de ganhar dinheiro com um FII. A primeira é com o rendimento gerado por mês com aluguéis e serviços, os dividendos mensais que Massaro destacou, que têm a vantagem de serem isento de Imposto de Renda (IR). A segunda é com a possível valorização da cota, caso o valor dos imóveis que ele investe direta ou indiretamente sejam vendidos a um preço maior do que o da compra. Lembrando que quando o investidor vender sua cota, aí já paga IR (alíquota de 20% sobre o ganho do capital).

“Na média, os fundos imobiliários estão rendendo 7% ao ano”, revela o analista-chefe da Necton. E, apesar dos riscos, as expectativas futuras são positivas, diante da queda da taxa de juros, diz.

Quedas nos juros tendem a aliviar o caixa das empresas, diminuindo o risco de inadimplência (de não pagamento dos aluguéis) e aumentando as chances de novas contratações e expansão da atividade, o que requer mais espaço, ou seja, o aluguel de novos imóveis. Uma alta da demanda tende a puxar os preços dos aluguéis, e os fundos ganham com isso.

Por outro lado, alguns fundos ganham com o faturamento dos inquilinos, que, no novo cenário de crescimento do país, com juros mais baratos para estimular consumo e investimento, também tendem a subir. Um crescimento do consumo também estimula os shoppings, boa notícia para os ativos que têm esses empreendimentos.

Além disso, Legat destaca que, com a crise que deixou o mercado imobiliário parado desde 2015, a oferta de lajes corporativas não é tão grande, e uma alta da demanda tende a pressionar os preços da locação, e a diminuir a vacância (imóveis sem estarem alugados), beneficiando os fundos.

Nos últimos anos, o valor dos aluguéis chegou a cair 50%, mas em alguns lugares, como a região da Avenida Paulista, em São Paulo, já voltaram a subir na faixa de 20% em 2019.

Atualmente, existem mais de 430 fundos imobiliários no país, contando as emissões privadas. A dúvida é: em qual investir? O professor Giácomo Diniz ensina como escolher um FII: “Primeiro ponto é olhar o ativo-objeto. Se é um galpão, shopping ou outros produtos mais sofisticados. E entender literalmente onde ele está investindo. O segundo passo é visualizar o que tem sido o fluxo de pagamento de dividendos mensais, lembrando que eles são isentos de IR. E o terceiro saber qual a reputação do gestor”.

“Gosto bastante dos fundos ‘tijolo’ multi-inquilinos’, diz Diniz. “Escolha um fundo diversificado, que invista em vários empreendimentos e em várias regiões”, aconselha Massaro.

E os especialistas alertam: fuja dos fundos que investem em apenas um empreendimento, mesmo que esse imóvel seja um shopping, com vários inquilinos.

ETFs: para ‘testar’ o mercado de ações

Outro investimento recomendado para quem ainda desconhece o mercado de ações e não se sente seguro para dar esse passo são os ETFs(Exchange Traded Funds, que são fundos de índices comercializados como ações). “Eu começaria com os fundos imobiliários, depois eu iria para os ETFs, e aí, durante esse processo, eu estudaria as bases para entrar na Bolsa”, orienta o professor.

Entre os ETFs, os recomendados são os que replicam o Ibovespa, índice de referência da Bolsa brasileira. Segundo Massaro, existem hoje 4 ETFs que reproduzem o índice do mercado de ações do Brasil. Ao investir neste ativo, é como se você comprasse uma pequena parte de todos os papéis listados em determinado índice de referência em vez de escolher ação por ação.

Um ETF que segue o Ibovespa subirá cerca de 20% se o Ibovespa subir esse percentual, descontando a taxa de administração, que nesses fundos varia entre 0,20% e 0,80% ao ano. No ano, até esta quinta-feira (31), o índice brasileiro somava valorização de 22%.

Na Bolsa, mercado ainda vê potencial de valorização: veja o que escolher

O passo seguinte é entrar de vez no mundo incerto da Bolsa de Valores. Mas não dá para “mergulhar no escuro”, é preciso estudar o mercado de capitais, aprender mais sobre a opção de investimento.

“O primeiro passo é entender o que se quer fazer na Bolsa, e selecionar ações com o objetivo de ser realmente acionista desses negócios. É preciso pesquisar os pilares da análise fundamentalista de ações. São esses pilares que permitem entender o que é relevante dentro de um mapeamento de uma empresa como um todo”, explica o professor de finanças.

Essa análise é para se evitar comprar ações apenas pelo desempenho que elas tiveram no passado. É preciso olhar para a frente.

Segundo Diniz, “para se trabalhar com renda variável, é preciso segurança, e segurança tem a ver com o conhecimento. Quanto mais afinidade que eu tenha com o setor ou empresa em que eu estou investindo, melhor”.

“Não estamos falando em investir, estamos falando em empreender em ações”, destaca a educadora financeira. Para entrar na Bolsa, é preciso ter uma visão de longo prazo e não se deve aplicar dinheiro que pode fazer falta, já que há risco da ação cair e perder valor, afirma Cíntia.

Uma das opção é escolher ações de empresas que paguem dividendos. “Você consegue essas informações no site das empresas, no site da B3”, diz ela.

E sempre escolher empresas em que se entenda o que elas fazem. “A Bolsa está em níveis recordes, o investidor não se pode deixar levar pela euforia”, afirma Massaro, que recomenda diversificar, comprando ações de vários setores.

De acordo com o analista-chefe da Necton, apesar do Ibovespa estar batendo recordes nas últimas semanas, as expectativas de valorização ainda são altas. A corretora ainda não fechou as projeções para 2020, mas ele acredita que o Ibovespa possa subir para a faixa dos 130 mil pontos, o que implicaria em um potencial de valorização de 20%.

“O adubo da valorização das ações é o próprio crescimento econômico”, segundo Diniz.

A entrada em Bolsa deve ser gradual. “Se a pessoa é superavitária, ou seja, se ela está conseguindo poupar todo o mês, ela passa régua, ou seja, a partir de agora, todo o dinheiro que ela poupar vai para a renda variável. Aí na hora em que ela sentir segurança no que ela está fazendo, ela começa a fazer a migração. Tira algumas coisas que tem em renda fixa e levar para renda variável. Nunca migrar tudo de uma vez. Na verdade, o ideal é começar com os aportes novos, depois alocar 10%, e aumentar à medida que se for sentindo confortável. A palavra-chave é conforto e segurança”, recomenda o professor de finanças do Ibmec.

Tesouro Direto: a renda fixa que pode dar lucro até no curto prazo

Mas o novo cenário não implica largar de vez a renda fixa. A poupança, porém, deve ser esquecida. Ela “não faz parte do repertório de um investidor financeiramente educado”, disse Massaro.

Em vez da poupança, o investidor deve optar pelos títulos do governo brasileiro, ofertados no Tesouro Direto, que são alternativa tanto para o curto prazo (fazer uma reserva de emergência) como para o longo prazo. A liquidez no Tesouro não é automática como a caderneta, mas ela demora apenas um dia útil, prazo bastante razoável, caso haja alguma emergência e o investidor precise de recorrer à sua reserva.

Os CDBs de liquidez diária de bancos médios ou pequenos, que oferecem melhores taxas, também podem ser uma alternativa para quem não quer perder dinheiro na poupança e quer ter os recursos à mão.

“Se a gente vai no Tesouro Direto, vemos títulos que pagam IPCA e taxas de juros reais, acima de 3%. Em que lugar do mundo você consegue isso hoje?. Então, a renda fixa está pior do que já esteve mas está longe de estar ruim para padrões mundiais”, comenta André Massaro.

“Para reserva de emergência, o Tesouro Selic ainda é imbatível, agora para longo prazo as grandes oportunidades ainda estão no Tesouro IPCA”, explicou o consultor financeiro.

A educadora financeira destaca ainda que, além de serem uma boa opção no longo prazo, os títulos do governo estão oferecendo uma chance de se ganhar dinheiro no curto prazo, com o novo cenário de queda das taxas de juro. Alguns papéis prefixados estão permitindo que se embolse ganhos, com a venda antes do prazo final.

Este tipo de títulos, embora sejam de renda fixa, estão sujeitos a oscilações diárias de preço devido ao efeito da marcação a mercado. Se o mercado acha que os juros vão cair, como está acontecendo atualmente, o valor do título aumenta. Com isso, pode ser interessante comprar esses títulos, vender antes do prazo, embolsar esse lucro extra em vez de ficar com o papel até ao final do prazo e receber o juro que foi acordado na compra.

Cuidado com novas opções de investimento: precatórios são a bola da vez

Nessa tentativa de sair buscando alternativas que possam pagar retornos melhores, os investidores, segundo Cíntia, estão olhando novos tipos de investimentos, mas ela alerta que é preciso cautela. “Não se pode só deixar-se levar pelo retorno”, destaca.

Dentre essas novas opções estão os precatórios, dívidas que algumas pessoas ou empresas têm direito a receber e que as obtém quando entram com alguma ação contra o Estado. Devido à morosidade da Justiça brasileira, empresas e pessoas físicas estão vendendo esse direito com desconto.

Em termos práticos funciona assim: imagine que uma pessoa tem na Justiça uma ação para receber R$ 100 mil do Estado. Mas ela não quer esperar o pagamento, e vende esse precatório para o investidor por R$ 80 mil. Ou seja, a taxa de retorno foi de 25% ou R$ 20 mil.

Segundo a educadora financeira, essa opção ainda não é regulada pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários), e o investidor precisa atentar-se à liquidez. Processos judiciais podem levar anos ou até décadas.


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