Em um mês de aversão ao risco mundial, com avanço dos temores de uma recessão à escala global devido ao acirramento da guerra comercial entre EUA e China, e de piora da crise na Argentina, quem reinou em agosto foram os investimentos considerados refúgio pelos investidores em épocas de turbulência: ouro e dólar.
A rentabilidade do metal bateu de longe o ganho das principais aplicações financeiras no Brasil ao saltar 17,95% no mês; no ano, o ouro negociado na Bolsa brasileira, a B3, já acumula 34,13% de alta.
Apesar de liderar em agosto, o ouro não é um investimento recomendado para o pequeno investidor, devido à sua forte variação e à burocracia para se aplicar no metal.
Na segunda colocação aparecem os fundos cambiais, que investem em moeda estrangeira, e foram impulsionados pela disparada do dólar. No mês, deram ganho de 9,13%, um pouco acima do que subiu a moeda americana, 8,46%.
Normalmente, os investidores entram neste ativo para se protegerem contra as flutuações de moedas fortes, como dólar e euro. Mas também são usados para o investidor lucrar com a alta da moeda.
Dólar: pior alta desde que Brasil perdeu grau de investimento
Em agosto, o dólar ante o real teve a maior alta mensal desde setembro de 2015, quando o Brasil perdeu o grau de investimento, o chamado selo de bom pagador, pela agência de risco Standard& Poor’s, a primeira a dar esse status ao Brasil em 2008. Terminou nos R$ 4,14, mas chegou a fechar acima de R$ 4,17 na quinta-feira passada (29).
O real foi a segunda moeda no mundo que mais desvalorizou em agosto, apenas perdendo para o ‘morto-vivo” peso argentino, que disparou expressivos 35,79% no mês.
“O real sofreu uma pressão acentuada em agosto, muito por conta do cenário externo caótico”, disse Alvaro Bandeira, economista-chefe do Banco digital Modalmais.
A par do dólar, o euro também subiu bastante em relação ao real. A moeda do bloco europeu ficou 7,66% mais caro no mês.
O quadro externo foi, de fato, bastante conturbado em agosto, com destaque para a escalada da guerra comercial entre EUA e China, após o presidente dos EUA, Donald Trump anunciar uma nova rodada de tarifas agora para 1º de setembro, e consequente retaliação chinesa e “contra-medidas” americanas.
O mercado receia que as tensões comerciais afetem lucro das empresas e o crescimento das economias, respigando para o resto do mundo, principalmente os países emergentes como o Brasil, mais dependentes da venda de matérias-primas.
O agravamento da crise da Argentina, com o resultado surpresa das prévia da eleição presidencial, que indicam que a esquerda deve ganhar no pleito de 27 de outubro, que levou ao tombo do peso e pedido de “moratória branca” do país atingiu em cheio o Brasil.
A Europa também não ajudou. A Alemanha entrou em recessão no segundo trimestre. Em Itália, a extrema-direita, acreditando que poderia ganhar em eleições antecipadas, fez pressão para a saída do premiê, que chegou a pedir demissão, mas recuou após formação de uma nova coalizão. Os dados econômicos da Zona do Euro também vieram negativos, e a ameaça do novo premiê britânico de tirar o Reino Unido da União Europeia, no chamado Brexit, mesmo sem acertar os termos do “divórcio” com o bloco europeu, preocuparam o mercado.
Bitcoin: moeda-refúgio?
Outro investimento que se deu bem no mês foi o Bitcoin (BTC), o ativo de renda variável que mais rendeu em agosto. No mês, a criptomoeda mais conhecida no mundo teve valorização de 3,49%, liderando, no ano, “de lavada” as restantes aplicações, com ganhos acima de 168%.
Confira o ranking das principais aplicações financeiras em agosto:
Investimento | Rentabilidade no mês | Rentabilidade acumulada no ano |
Ouro | 17,95% | 34,13% |
Fundos cambiais* | 9,13% | 9,09% |
Dólar | 8,46% | 6,49% |
Euro | 7,66% | 2,70% |
Bitcoin | 3,49% | 168,31% |
Tesouro Selic 2021 | 0,51% | – |
Poupança antiga** | 0,50% | 4,07% |
CDB | 0,45% | 4,08% |
Fundos de renda fixa de curto prazo (média)* | 0,42% | 4,03% |
Poupança nova | 0,37% | 3,01% |
Ibovespa | -0,37% | 15,07% |
IGP-M | -0,37% | 4,09% |
Tesouro Prefixado 2025 | -1,52% | 15,84% |
Fundos de ações livre* | -3,02% | 16,61% |
Tesouro IPCA + 2035 | -3,24% | 26,89% |
Fonte: Anbima, B3, Valor Pro, Banco Central, IBGE, Tesouro Direto, Coinbase; *até dia ao dia 27 **depósitos feitos até dia 4 de maio de 2012
Alguns especialistas dizem que a moeda virtual é vista como um investimento de longo prazo, como o ouro, e que está servindo de refúgio em momentos de incerteza, como o atual.
Renda fixa rendeu menos de 0,50%
Já quem tem suas economias aplicadas em renda fixa não teve o que comemorar no mês. O título público atrelado à taxa básica de juros, que foi cortada no dia 31 de julho, de 6,50% para 6% ao ano, que foi o melhor entre os investimentos mais conservadores, pagou apenas 0,51% em agosto, o mesmo que a poupança antiga, que remunera os depósitos feitos até 4 de maio de 2012.
Depois vieram CDB (Certificado de Depósito Bancário), com rendimento de 0,45%, e fundos de renda fixa de curto prazo com 0,42% (ganho até o dia 27 de agosto).
Estas são as rentabilidades absolutas das aplicações conservadoras. Os números não levam em conta o desconto do Imposto de Renda (IR), que incide sobre fundos e títulos do Tesouro Direto. Com o pagamento do imposto, o ganho dos investidores ficou menor.
Todos ganharam da nova poupança, que seguiu sua trajetória de queda, após a redução da Selic. No mês, o ganho da caderneta caiu a 0,37%; no ano, ela pagou 3% aos depósitos feitos depois de 4 de maio de 2012. É importante destacar que a poupança não paga IR.
Bolsa e Tesouro IPCA na lanterna
Na lanterna, ficaram os investimentos ligados ao mercado de ações, como os atrelados ao Ibovespa, referência da Bolsa brasileira, que fechou o mês em queda de 0,67%, mesma variação da inflação do aluguel, e os fundos de ações livre, que tiveram queda média de 3,02%. O comportamento dos papéis do mercado de capitais reflete, tal como o dólar, a piora do cenário externo.
Além da cena externa, a Bolsa sentiu as suspeitas de corrupção sobre Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados e principal articulador das reformas do governo Bolsonaro, a queda da popularidade do presidente, que iniciou uma crise diplomática com a França por conta dos incêndios na Amazônia, e um adiamento da reforma da Previdência no Senado.
Alguns títulos do governo também fecharam com baixas no mês, como o Tesouro Prefixado e o Tesouro IPCA 2035, título público que é atrelado à inflação e que foi o pior investimento de agosto, com contração de 3,24%.
É preciso destacar, porém, que apesar do desempenho negativo em agosto, estas são as aplicações financeiras que mais dão retorno ao investidor em 2019 (ver tabela acima).