A solução a que chegaram os parlamentares chilenos para acabar com as manifestações violentas, que duram há quase um mês e deixaram ao menos 23 mortos, o estabelecimento de uma nova Constituição, deve gerar instabilidade política e econômica no país pelos próximos dois anos. A avaliação é de José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
As incertezas no Chile vêm penalizando o Brasil, com os investidores “fugindo” da América Latina, que ainda sofre com turbulências em outros países da região, como Bolívia, Venezuela, Argentina, Peru e Equador. Na última quinta-feira (14), véspera de feriado, o Ibovespa, índice de referência da Bolsa brasileira, voltou aos 106 mil pontos, enquanto o dólar ante o real subiu aos R$ 4,193, segunda maior cotação de sua história.
Em resposta aos pedidos das ruas, os congressistas do Chile decidiram, na última sexta-feira (15), realizar um plebiscito em abril de 2020 para estabelecer uma nova Constituição, substituindo a atual que remonta ao período de ditadura militar.
O plebiscito deve questionar primeiramente se a população está de acordo com a formulação de uma nova Constituição. Pesquisas indicam que 8 em cada 10 chilenos querem que ela mude. Aos eleitores que responderam que sim, o modelo deve perguntar também quem deve formar a assembleia constituinte: apenas cidadãos eleitos para essa função ou uma comissão mista incluindo congressistas.
No caso da comissão mista, seriam 50% de parlamentares já eleitos e outros 50% de delegados. O quorum para a aprovação das propostas de mudança será de dois terços.
Ficou acertado que a eleição da composição da assembleia ocorrerá em outubro de 2020, coincidindo com as eleições regionais e municipais. A assembleia terá nove meses, prorrogáveis por mais 3 meses para redigir a nova Constituição, que será escrita do zero em vez de ter como base o texto de 1980.
“Na melhor das hipóteses, somente em 2022, ou seja, no próximo governo, o Chile terá uma nova Constituição. Serão pelo menos dois anos e meio de incertezas politicas e econômicas. Vai ser necessário muito juízo por parte dos políticos chilenos para que este esquema dê certo”, segundo escreveu o economista-chefe da Genial no Twitter.
“E ainda pior: ninguém sabe, à priori, qual será a composição da Assembleia Constituinte. Isto somente será conhecido daqui a um ano. Até lá, os investimento devem cair, a economia desacelerar e, provavelmente entrar em recessão. O ambiente em outubro vai estar tenso”, acrescentou Camargo.
O que as ruas querem mudar na Constituição
A atual Constituição chilena foi aprovada em 11 de setembro de 1980 em um polêmico plebiscito durante o regime militar Augusto Pinochet (1973-1990). Embora alterada várias vezes, a Carta Magna é criticada por ser uma herança de Pinochet e por dar um papel residual do Estado na prestação de serviços básicos, o que é precisamente uma das razões para os protestos que começaram em 18 de outubro.
Outra das críticas à Constituição é que ela é muito rígida: modificá-la requer maiorias de dois terços ou três quintos dos deputados e senadores em exercício.
Outro questionamento da Constituição tem a ver com direitos sociais, uma vez que o texto constitucional consagra um “Estado subsidiário” que não oferece diretamente benefícios relacionados à saúde, educação ou Previdência Social, delegando isso ao setor privado.
*Com BBC Brasil