O dólar comercial ante o real emendou o terceiro recorde consecutivo nesta quarta-feira (27), e desta vez, a culpa foram os resultados do crescimento da economia americana acima do esperado.
Nem mesmo a atuação do Banco Central (BC), que realizou três operações no mercado para dar mais liquidez ao mercado, nem as boas notícias sobre a primeira fase do acordo comercial entre EUA e China foram suficientes para travar a disparada da moeda americana. Com isso, o turista ficou mais longe da Disney nas próximas férias. Agora, resta ao brasileiro optar por aproveitar a sua folga no país. Dólar mais caro deixa preços das passagens e hospedagens no exterior mais elevados.
No fechamento, o dólar encerrou nos R$ 4,259, com alta de 0,44%, maior valor nominal desde a criação do Plano Real, em 1994. No pior momento do pregão, a divisa dos EUA chegou a subir a R$ 4,267. No mês, a alta já passa de 6%.
‘Efeito Guedes’
Na véspera, a moeda já havia batido recorde, nos R$ 4,24, depois das declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, que se mostrou confortável com o dólar alto e sugeriu que a divisa deve ficar nesses patamares “por um bom tempo”.
“O dólar está alto. Qual o problema? Zero. Nem inflação ele (dólar alto) está causando. (…). É bom se acostumar com juros mais baixos por um bom tempo e com o câmbio mais alto por um bom tempo”, disse Guedes em entrevista na embaixada brasileira na capital americana, onde participou do Fórum de Altos Executivos Brasil-EUA.
Guedes também falou sobre um tema polêmico para o mercado, o AI-5, um instrumento da ditadura militar que fechou o Congresso e cassou as liberdades individuais. “Não se assustem se alguém pedir o AI-5” caso o ex-presidente Lula convoque “todo o mundo para quebrar a rua”, afirmou.
Durante o pregão desta terça, a divisa chegou até a passar de R$ 4,27, mas esfriou a alta após o BC surpreender e entrar no mercado com dois leilões de dólares à vista, quando usa as reservas internacionais, sem recompra no futuro.
Na segunda, depois da divulgação dos dados das contas externas, que mostraram um agravamento do déficit, com queda das exportações, por conta da desaceleração global, a moeda também renovou a máxima histórico e chegou aos R$ 4,215.
Melhora do PIB americano
A alta do dólar desta quarta reflete o maior crescimento econômico nos EUA. O Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas em um país) dos EUA cresceu a uma taxa anualizada de 2,1% no terceiro trimestre, contra 1,9% previstos.
Essa melhora da economia reforça a expectativa de que o Fed (Banco Central dos EUA) pare de cortar os juros, e sem corte, o capital acaba por não migrar para países emergentes como o Brasil. Sem dólar entrando, e com investidores saindo, o dólar sobe e o real cai.
“O dólar está se ajustando ao dólar forte no exterior, principalmente depois dos indicadores positivos americanos como o PIB. O mercado doméstico também está trabalhando com essa tendência de alta depois da sinalização do Paulo Guedes”, disse Fernando Bergallo, diretor de câmbio da FB Capital.
Risco-país cai
De acordo com Pablo Syper, diretor da Mirae Asset e colunista do Economia Bárbara, “o dólar bateu recorde, mas o CDS caiu. O risco-país cai e o dólar sobe. Tudo melhorou menos o dólar. A Bolsa subiu, os juros arrefeceram, e o risco-país caiu, mas o dólar segue pressionado”.
O Credit Default Swap (CDS) de cinco anos do Brasil, um termômetro do risco-país, recuou para 123 pontos nesta quarta-feira, mesmo com a alta do dólar, para níveis em que o país estava quando tinha o grau de investimento, uma espécie de selo de bom pagador que atrai investimentos.
Feriado nos EUA e Ptax
“Não esquecer que há formação de Ptax na sexta e amanhã é feriado nos EUA e a liquidez estará reduzida”, destacou o diretor da Mirae.
Nesta quinta-feira (28), as Bolas americanas vão estar fechadas por conta do Dia de Ação de Graças, e na sexta (29), dia da Black Friday, vão encerrar mais cedo, pelas 13h, o que acabará por esvaziar os negócios no mercado brasileiro.
A Ptax definida no último pregão de cada mês é usada como referência para a maior parte dos contratos cambiais do mês seguinte. Por isso, os investidores tendem a “brigar” para conseguir cotações que favoreçam suas posições, aumentando assim a volatilidade na reta final do mês.
Segundo Spyer, “o dólar não tem muito espaço para subir porque o Banco Central está deixando muito claro que nos R$ 4,26, R$ 4,27 ele faz leilões de venda”, em um movimento para dar liquidez ao mercado.
Atuação do BC deve continuar até ao fim do ano
O diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra, afirmou nesta quarta-feira que a autoridade monetária deve continuar a oferecer a venda de dólares no mercado à vista com contratos de swap reverso (que corresponde à compra de dólares no futuro) neste final do ano, quando sazonalmente há maior demanda por liquidez, mas destacou que “uma hora a gente vai ter que interromper isso”.
Com as atuações, o BC quer injetar mais dólares no mercado e, assim, atenuar a alta da divisa.
Para Edson Ribeiro Silva, gestor da LAIC-HFM Gestão de Recursos, essas intervenções do BC não têm capacidade para alterar o movimento de longo prazo do dólar, que sofre com a falta de fluxo de capital devido a uma aversão a risco global, crise na Argentina e queda das exportações de “commodities” (matérias-primas), muito por conta da desaceleração global impactada pela guerra comercial.
EUA-China: acordo parcial à vista
Logo na abertura, o mercado chegou a se animar com as declarações do presidente dos EUA, Donald Trump, na terça (26) à noite de que EUA e China estão próximos de fechar um acordo comercial preliminar. O comentário de Trump veio depois de autoridades de alto escalão de ambos os países terem uma nova conversa telefônica e concordarem em seguir discutindo questões pendentes para finalizar a chamada “fase 1” do acordo.
Também do lado chinês houve uma uma declaração de que o acordo parcial estaria “iminente”.