Seu Bolso
Com negativa de Trump e Lula solto, dólar dispara e fecha perto de R$ 4,17
Mercado reagiu negativamente à fala do presidente americano que desmentiu os chineses sobre retirada de tarifas e à decisão do STF que permitiu libertar o ex-presidente petista; na semana, moeda tem maior alta em 14 meses
O dólar fechou seu terceiro dia consecutivo de alta nesta sexta-feira (8), em um pregão afetado pelas incertezas com a trégua comercial entre EUA e China, sentimento que foi agravado após a fala do presidente americano, Donald Trump, e pela instabilidade política causada pela decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) da véspera que permitiu a soltura do ex-presidente Lula da Silva.
A moeda americana fechou nos R$ 4,168, uma alta de 1,83%. Na semana, que teve ainda a frustração com os leilões do pré-sal devido à fraca participação de empresas estrangeiras, o dólar subiu 4,34%, a maior alta semanal contra o real em mais de 14 meses, quando a divisa avançou 4,85% na semana encerrada no dia 24 de agosto de 2018.
“O dólar está atrás de novas máximas, acima de R$ 4,15. O movimento aumentou depois do Trump dizer que não concorda com a reversão das tarifas à China”, disse Pablo Spyer, diretor da Mirae Asset e colunista do Economia Bárbara, lembrando que o dólar também sobe lá fora. “O DXY (índice que mede variação do dólar ante uma cesta de seis moedas fortes) está no quinto dia de alta”, afirmou Syper.
‘Efeito Lula’
Nesta sexta (8), os ruídos políticos acentuam a percepção de falta de apetite do investidor estrangeiro pelo país, já revelada pela ausência de capital estrangeiro nos leilões do pré-sal.
A decisão do STF de considerar inconstitucional a prisão de um réu condenado em segunda instância, entendimento que vai libertar vários presos da Lava Jato, incluindo o ex-presidente Lula, que, entretanto, teve autorização para sair da cadeia em Curitiba pouco antes do mercado de câmbio fechar, mexeu com o humor do mercado. Logo após o anúncio de que o juiz Danilo Pereira Júnior, da 12ª Vara Federal de Curitiba, havia expedido o mandado de soltura do ex-presidente, o dólar subiu mais.
Com a soltura, é esperada uma intensificação da polarização no país, em um momento em que a América Latina vive onda de protestos violentos contra os governos locais. Diante das incertezas, o estrangeiro retrai a aposta no país, que já sofre com o diferencial cada vez menor das taxas de juros brasileiras em relação aos EUA.
A própria postura do ex-presidente acirrou mais essa percepção. Antes do STF declarar que o réu só pode ir preso após esgotados todos os recursos (as quatro instâncias), Lula afirmou que sairá da prisão “mais à esquerda” do que entrou, prometeu “um grande pronunciamento à nação” e que planeja uma partida de futebol com membros do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) no próximo dia 21 em Guararema (SP). Esse pronunciamento de Lula decorreu há pouco, e começou um pouco antes do mercado de ações fechar.
“É provável que o retorno do ex-presidente Lula ao jogo político contribua para a continuidade do ambiente de polarização do país”, segundo Ribamar Rambourg, coordenador de Análise Política da Genial Investimentos.
Para Rambourg, “o PT obterá uma vitória importante, mas o presidente Jair Bolsonaro também poderá ser beneficiado, já que poderá explorar ainda mais a retórica antipetista em seus discursos”.
A decisão do STF, porém, não torna Lula elegível. Segundo a consultoria Arko Advice, ele continua inelegível com base na Lei da Ficha Limpa. Por isso, diz a decisão mais importante para o Lula é a da segunda turna do STF que pode julgar a suspeição do ministro da Justiça, Sérgio Moro, então juiz da Lava Jato, que condenou Lula em 1ª instância. Essa decisão pode anular a única condenação colegiada de Lula e torná-lo elegível.
Além isso, a libertação do ex-presidente petista, de acordo com Rambourg, não deve impactar na agenda de reformas que o governo tenta emplacar no Congresso, como o Pacto Federativo. “É pouco provável que haja impactos significativos em relação à tramitação da agenda econômica no Congresso Nacional, que atualmente depende muito mais dos presidentes das Casas Legislativas e das lideranças partidárias do que do Executivo”, avaliou o analista político.
China e EUA: novela ganha mais um capítulo
O pregão já começou negativo também reagindo às dúvidas em relação ao fim da guerra comercial, que aumentaram após o presidente Trump negar a informação do porta-voz do Ministério de Comércio chinês, Gao Feng, da véspera, de que os EUA teriam concordado em retirar as tarifas ao país asiático para assinar a primeira parte do acordo comercial com a China.
“A China quer conseguir uma anulação (de tarifas), não uma anulação completa, porque eles sabem que eu não vou dar”, afirmou o mandatário americano à imprensa à porta da Casa Branca.
Pequim vem pedindo a abolição de tarifas adicionais há meses como condição para a assinatura de um tratado, já que a guerra de taxas está afetando cada vez mais a economia do gigante asiático.
Peter Navarro, consultor intransigente de política comercial de Trump, lembrou a posição do governo. “Não há acordo para retirar as tarifas aduaneiros como pré-condição para um acordo”, disse ele à rádio NPR.
“A única pessoa que pode tomar essa decisão é Donald Trump”, acrescentou, descrevendo o anúncio de Gao Feng da “propaganda” chinesa divulgada pela imprensa.
Com as declarações americanas, aumentam as incertezas em relação ao fim do guerra comercial e até sobre a assinatura do acordo “fase 1” entre as duas potências.
Balança comercial chinesa: números positivos
Nem os dados positivos da balança comercial chinesa animaram os investidores. Em outubro, as exportações chinesas tiveram queda de 0,9% na comparação com igual mês de 2018, contra previsão de queda de 3,1%, segundo analistas consultados pelo “The Wall Street Journal”. Já as importações diminuíram 6,4%, também menos que o projetado (8,6%). Isso quer dizer que o país está sofrendo com a guerra comercial, mas menos do que o esperado.
O dado das importações pela China é particularmente relevante para o Brasil, que vem aumentando suas exportações à China, principalmente de carne suína e soja, com a guerra comercial e a peste suína africana, que afeta a oferta de porcos chineses.